Acossado pela Hora da Verdade, Jair Bolsonaro inspira-se em Donald Trump e alimenta a esperança de derrubar sua inelegibilidade
Jair Bolsoanro e ato golpista em Brasília (Foto: REUTERS/Carla Carniel | Joédson Alves/Agencia Brasil)
Os fatos políticos da última semana, marcada pela operação Hora da Verdade, que evidenciou o papel de Jair Bolsonaro como líder da intentona golpista de 8 de janeiro, um segredo de polichinelo, ainda não representam o xeque-mate definitivo no líder da extrema-direita no Brasil. Uma consequência que parece óbvia da operação é a iminente prisão do ex-presidente. Se alguns baderneiros pegaram 17 anos de cadeia, é natural imaginar que o organizador do caos pegue a pena máxima, estimada por juristas em 23 anos de prisão. Isso deve acontecer ainda este ano, a partir do seguinte roteiro: o ministro Alexandre de Moraes encerra as investigações, o procurador-geral Paulo Gonet apresenta a denúncia, apontando Bolsonaro como chefe da conspiração, e o Supremo Tribunal Federal pauta seu julgamento – quanto antes isso ocorrer, melhor para a sociedade brasileira, como aponta o editorial deste domingo do Brasil 247.
A eventual prisão de Bolsonaro, no entanto, não resolve o problema central. Mesmo que ele possa vir a se enfraquecer na cadeia, perdendo capital político, ainda assim representará uma grande parcela da sociedade brasileira, que ou se identifica com o fascismo ou é vítima de dissonância cognitiva. Por isso mesmo, é provável que Bolsonaro permaneça como o único nome capaz de enfrentar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2026. Ciente desta realidade, ao se ver acossado, Bolsonaro também moveu uma peça no tabuleiro neste fim de semana, lançando-se candidato a presidente em 2026, em entrevista à revista Veja. No breve depoimento, ele se colocou como "vítima de perseguição" daqueles que gostariam de "retirá-lo de combate" e deixou claro que não pretende transferir a ninguém seu capital político.
Em essência, é a mesma estratégia do ex-presidente estadunidense Donald Trump, com uma diferença central. Nos Estados Unidos, ao contrário do Brasil, o poder judiciário não retirou os direitos políticos de Trump. Ainda assim, Bolsonaro e seu séquito de aliados acreditam que a inelegibilidade do ex-presidente é precária, podendo ser revertida antes de 2026. Na entrevista a Veja, Bolsonaro lembrou do caso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que estava inelegível e recuperou seus direitos políticos antes das eleições presidenciais de 2022, após uma decisão do ministro Edson Fachin. Também na revista Veja, uma nota publicada na coluna Radar, revelou que o bolsonarismo conta com uma decisão monocrática do ministro Nunes Marques para reverter a inelegibilidade. Caso Trump vença as eleições presidenciais deste ano nos Estados Unidos, o que parece provável, é também possível que as pressões externas sobre as instituições brasileiras aumentem. Ao menos, esta é a esperança do bolsonarismo.
Quando Trump foi fichado pela polícia, no ano passado, a estratégia foi transformar o "mugshot" numa peça central de campanha. Não por acaso, Trump a postou em suas redes sociais, com a mensagem "Never Surrender" (nunca se renda). Caso Bolsonaro seja efetivamente preso, o que é uma necessidade civilizatória no Brasil, o mais provável é que o ex-presidente transforme a prisão em ato de campanha, colocando-se como "vítima do sistema", ainda que ele seja a representação mais plena e acabada do sistema de exploração e opressão que marca a sociedade brasileira.
É também possível que Bolsonaro hoje se veja como um personagem de características messiânicas e esteja torcendo pela própria prisão, que, repita-se, é necessária e será pedagógica. Como o jogo ainda está sendo jogado, ele imagina que poderá ressurgir como uma fênix, tal qual Donald Trump, mas também corre o risco de terminar como o peruano Alberto Fujimori. O tempo dirá.
Este artigo não representa a opinião do Blog e é de responsabilidade do colunista Leonardo Attuch