Crise entre Cid e Ciro Gomes chega ao ápice, e PDT já soma 73 baixas

Desfiliação em massa reabre troca de acusações. Senador critica 'isolamento' do irmão; dirigente ironiza e chama dissidência de 'postura peculiar' de seu 'respeitável grupo'

Por Camila Turtelli , Cibelle Brito e Luísa Marzullo — Brasília e Rio de Janeiro

Racha em família: Ciro e Cid Gomes travam batalha pelo controle do PDT no Ceará — 📷: Waldemir Barreto/Agência Senado

No mais grave episódio da disputa política na família Ferreira Gomes protagonizada pelo ex-ministro Ciro Gomes e o seu irmão e senador, Cid Gomes (PDT-CE), 43 prefeitos cearenses anunciaram a desfiliação do PDT. O grupo se soma a 18 parlamentares, outros dez chefes de Executivos municipais e dois filiados sem mandato que já haviam deixado a sigla, contabilizando 73 baixas desde o início da crise.

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A desfiliação em massa, definida durante evento com 46 prefeitos na terça-feira em Fortaleza, reabriu a guerra de narrativas e os ataques entre os dois grupos que se antagonizam e são capitaneados por Ciro e Cid. A mais recente debandada se deu entre aliados do parlamentar. Um dos prefeitos que desembarcará do PDT é Ivo Gomes, irmão de Cid e Ciro que comanda a cidade de de Sobral. Também está de saída a irmã deles e deputada estadual, Lia Gomes.

O grupo contesta a posição do PDT nacional, chefiado pelo deputado federal André Figueiredo, aliado de Ciro. A crise escalonou nas últimas semanas, após um reunião que terminou em briga e troca de ofensas entre os irmãos Gomes. A ideia à época era pôr fim a uma desavença envolvendo o diretório estadual da sigla no Ceará, alvo de disputa judicial entre os irmãos.

Cid chama de perseguição os desentendimentos com o diretório nacional. Na semana passada, o senador conseguiu uma vitória na Justiça, e o comando do PDT cearense voltou para o seu grupo. Em resposta, o presidente do PDT, ligado a Ciro, afirmou que formalizaria um processo de expulsão do senador. A resposta política veio esta semana, com a debandada dos prefeitos. A ameaça de Figueiredo de expulsar Cid do partido, segundo interlocutores, irritou Carlos Lupi, que se licenciou da presidência da sigla para assumir o Ministério da Previdência.

O cenário preocupa a cúpula do PDT, de olho nas eleições municipais do ano que vem. Os resultados recentes mostram que o partido está minguando. Em 2020, a sigla elegeu 314 prefeitos (ante 331 em 2016), 65 deles no Ceará, incluindo o da capital, Fortaleza, José Sarto. Perder mais da metade desse legado complica as composições de chapa e reduz os palanques do partido.

Cid afirma que sem as alianças com legendas, como o PT, o PDT terá dificuldade para formar chapas e ter tempo de TV na propaganda partidária:

—Há por parte da Nacional um desrespeito com a maioria do partido aqui. No Ceará, o PDT é o maior partido com representação. Só queremos retomar uma aliança histórica com PT e outros partidos. Tem uma fração minoritária que quer um caminho diferente, o de isolamento, repetindo o equívoco de 2022.

Segundo o senador, compartilham da opinião cinco deputados federais, 13 dos estaduais e mais de 40 prefeitos:

—Poderíamos continuar brigando, mas chega uma hora que as pessoas compreendem que não são bem-vindas.

As frases polêmicas de Ciro Gomes na campanha presidencial, conhecido por gafes e a língua solta.

  • "Um comício para gente preparada, você imagina eu explicar isso na favela, né", disse em evento na Firjan.
  • "Fizeram (no Chile) uma constituição completamente mistificadora, cheia de peculiaridades idenditárias, uma série de baboseiras desse esquerdismo", disse ao comentar a votação da nova Constituinte chilena.
  • “Será que não entendem que Lula está cada dia mais fraco — fisicamente, psicologicamente e teoricamente — para enfrentar a direita sanguinária?”, publicação, depois apagada, sobre a saúde de Lula.

 Do outro lado, o presidente do PDT, o deputado federal André Figueiredo (CE), minimiza possíveis prejuízos para o desempenho do partido e lembra que nenhum dos prefeitos chegou a pedir oficialmente a desfiliação até esse momento:

—Infelizmente, o senador Cid, uma pessoa extremamente qualificada junto com o seu grupo, não consegue conviver com divergências dentro do mesmo partido e tem que impor as suas vontades.

Essa ala do partido, contrária a Cid, contesta a forma como a reunião que levou a debandada de prefeitos foi conduzida. Para eles, houve constrangimentos aos prefeitos.

—Não tem divisão no PDT do resto do país. Nós temos que conviver, lamentavelmente, com essa postura que é, digamos assim, peculiar aos partidos que o senador Cid, com seu respeitável grupo, participa — disse Figueiredo.

Relembre os desentendimentos entre os irmãos

  • Aliança com petistas: As divergências entre Cid e Ciro Gomes ocorrem desde as eleições do ano passado e envolvem a aliança com o PT. Cid apoiou o hoje presidente Lula (PT) no segundo turno, indo de encontro ao irmão.
  • Aproximação com Elmano: O grupo de Cid passa a defender que o PDT retome a aliança com o PT e seja base do governador Elmano de Freitas (CE). Ciro segue em outra direção e prega a oposição.
  • Disputa por diretório: Em outubro, com o aval de Ciro, André Figueiredo destituiu a Executiva do Ceará, que foi reestabelecida via liminar. Após a retomada, Cid convocou novas eleições locais e foi eleito presidente estadual. Horas depois, por meio da Justiça, o grupo de Ciro retoma o comando e a direção volta para Figueiredo.
  • Discussão em reunião: No último dia 27, encontro do PDT no Rio termina com discussão calorosa entre Ciro e Cid.
  • Desfiliações aumentam: A briga intensificou as desfiliações: já são 73, sendo 43 prefeitos anteontem. A disputa tem retardado a definição de pré-candidaturas a prefeito nas capitais. Até o momento, apenas três foram lançadas: Duda Salabert, em Belo Horizonte; Juliana Brizola, em Porto Alegre; e o Goura, em Curitiba.

O Globo

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