Artigo do jornalista Roberto Maciel:
Assim escreveu Machado de Assis, em fala de Quincas Borba: “Supõe tu um campo de batatas e duas tribos famintas. As batatas apenas chegam para alimentar uma das tribos que assim adquire forças para transpor a montanha e e ir à outra vertente, onde há batatas em abundância; mas, se as duas tribos dividirem em paz as batatas do campo, não chegam a nutrir-se suficientemente e morrem de inanição. A paz nesse caso, é a destruição; a guerra é a conservação. Uma das tribos extermina a outra e recolhe os despojos. Daí a alegria da vitória, os hinos, aclamações, recompensas públicas e todos os demais feitos das ações bélicas. Se a guerra não fosse isso, tais demonstrações não chegariam a dar-se, pelo motivo real de que o homem só comemora e ama o que lhe é aprazível ou vantajoso, e pelo motivo racional de que nenhuma pessoa canoniza uma ação que virtualmente a destrói. Ao vencido, ódio ou compaixão; ao vencedor, as batatas”.
Vamos a outra visão, então:
Ex-deputado estadual, ex-prefeito de Fortaleza, ex-governador do Ceará, ex-ministro, ex-deputado federal e candidato a presidente da República (lembro essas passagens para expor a relevância do sujeito). Ciro Gomes tem um incomum e, por isso, invejável currículo político. Também carrega na história que construiu a rara capacidade de trocar de partido com frequência imoderada. PDS, PMDB, PSDB, Pros, PSB, PDT são siglas pelas qual ele e o grupo que o segue passaram – todas ficando em estado de penúria após as temporadas às quais se submeteram aos chamados “FG Brothers”.
Esse caráter fez com que várias siglas – incluindo o PT – estabelecessem uma blindagem que afastasse Ciro ou o impedisse que as cercasse, as assediasse, cortejasse e ingressasse nelas. Era uma questão de prevenção de perdas e de preservação da imagem.
Isso registrado, restava a Ciro demolir um último espaço: o da família. Apresentado como líder de um grupo organizado e disciplinado no qual se encontram os irmãos Cid, Lia, Ivo e Lúcio – esse último sem vida parlamentar -, ele parece ter conseguido o que faltava.
Assim como desafetos políticos, criados ao longo de discussões, divergências e até discórdias, os irmãos de Ciro já não falam mais com ele. Perceberam que é um péssimo negócio estar subjulgados às vontades de um líder que não lidera, mas apenas faz valerem os próprios interesses.
Ciro e seus interesses estão agora certos de que ficarão com as batatas na guerra travada no campo do PDT. Cid, os outros irmãos e mais uma legião de aliados, deixarão o partido e se farão acompanhar de “ódio ou compaixão” pelo que está ocorrendo no desmonte da legenda.
Sobrará para o currículo de Ciro Gomes arrastar para o limbo em que se recolherá, por isolacionismo voluntário, nomes qualificados como o do ex-prefeito de Fortaleza Roberto Cláudio. O atual, José Sarto, pobre de virtudes, também seguirá igual rumo.
É fato: Ciro vai ficar com as batatas. Terá valido a pena?