Até MPF se opôs a decisão de juiz que tentou constranger a família Gomes

Por entender que o cumprimento de um mandado de busca e apreensão contra Ciro Gomes e o senador Cid Gomes (PDT-CE) seria contraproducente porque a investigação apura fatos que ocorreram há quase 11 anos, o Ministério Público Federal se manifestou de forma contrária ao pedido da Polícia Federal.


Decisão controversa que determinou mandado de busca e apreensão contra Ciro Gomes não contou com anuência do MPF. Imagem: José Cruz/Agência Brasil.

A manifestação foi assinada pelo procurador da República Luiz Carlos Oliveira Júnior. "A eficácia da medida ora pretendida pela autoridade policial exige a contemporaneidade dos fatos supostamente criminosos praticados, o que não se verifica", disse.

A PF investiga supostas fraudes e pagamentos de propina a políticos na construção do estádio Castelão, em Fortaleza, uma das sedes da Copa do Mundo de 2014. Ciro não ocupava cargo público na época. A obra custou naquele período cerca de R$ 500 milhões. Itaquerão (SP) e Maracanã (RJ), cerca de R$ 1 bilhão. E o estádio Nacional de Brasília, por volta de R$ 1,5 bilhão.

"Sobretudo quando sopesado que implicam em medida drástica de ingresso na residência dos investigados, onde expõe pessoas alheias à investigação em curso como, por exemplo, filhos menores de idade, cônjuges, dentre outros, além de implicar em grande exposição social no local de residência dos investigados e de seus familiares", afirmou o procurador.

Apesar da posição contrária do Ministério Público Federal, o juiz Danilo Dias Vasconcelos de Almeida, da 32ª Vara Federal Criminal no Ceará, acatou o pedido. O mandato foi cumprido nesta quarta-feira (15/12).

O magistrado determinou ainda a quebra dos sigilos bancário, fiscal, telefônico e telemático de Ciro, Cid e Lúcio Gomes, além de outros investigados. Em relação a esses pedidos, o MPF se manifestou favoravelmente por entender que esse seria o meio adequado para obter provas sobre a suposta prática de ilícito.

O mandado de busca e apreensão contra os irmãos Gomes provocou controvérsia tanto entre políticos como na comunidade jurídica. "Eu tenho absoluta segurança de que é ordem de Bolsonaro, tal a violência e arbitrariedade", disse Ciro (PDT), pré-candidato a presidente nas eleições de 2022.

Segundo o ex-ministro, o presidente Jair Bolsonaro (PL) "transformou o Brasil num Estado Policial que se oculta sob falsa capa de legalidade".

Ciro recebeu manifestações de solidariedade do ex-presidente Lula (PT). "Quero prestar minha solidariedade ao senador Cid Gomes e ao pré-candidato a presidente Ciro Gomes, que tiveram suas casas invadidas sem necessidade, sem serem intimados para depor e sem levar em conta a trajetória de vida idônea dos dois. Eles merecem ser respeitados", disse o petista.

Desagravo de juristas e Holocausto

Um grupo de 20 juristas com nomes como Lenio Streck, Silvia Pimentel, Pedro Serrano e Celso Antônio Bandeira de Mello assina nota de desagravo contra a decisão.

No texto, os especialistas criticam o uso descabido do sistema judicial como forma de perseguição política. "Mais uma vez — apesar de tanto já se ter combatido os excessos da dita operação "lava jato" —, a comunidade jurídica assiste, com perplexidade, a sobreposição do Direito pela sanha autoritária de agentes do sistema de justiça contra personalidades políticas importantes de nosso país, agindo como verdadeira polícia política", diz trecho da nota. Clique aqui para ler na íntegra.

Outra decisão recente do juiz Danilo Dias Vasconcelos de Almeida causou espécie na comunidade jurídica. Ele absolveu um homem acusado de racismo após negar o holocausto. A decisão foi contestada pelo MPF. Segundo o órgão, a fundamentação apresentada considera que todas as opiniões são discutíveis e, portanto, "sequer haveria espaço para a tipificação dos crimes contra a honra e muito menos do racismo".

Outro crítico da decisão foi Lenio Streck, colunista da ConJur. O  jurista afirmou que um juiz negar o holocausto é como duvidar se o homem foi a lua. O juiz respondeu ao professor também em texto publicado pela ConJur.

Sobre a decisão recente envolvendo Ciro e Cid, Lenio afirmou que mais uma vez fatos antigos são requentados e dão azo a espetacularizações judiciais. "Isso me lembra as decisões de Sergio Moro. Lembro também do que aconteceu com o então governador Beto Richa, de igual forma fizeram isso com o ex-governador Ricardo Coutinho. Vamos dar nome às coisas: lawfare, o uso politico do direito contra os adversários", sustentou.

Lenio explica que a receita é simples: pega-se um fato velho, um político com ou sem mandato, usa-se o discurso de combate à corrupção e pronto. "Requenta-se tudo e a mídia fará o restante. Falta só a emissão de mandados de prisão. Mas isso é detalhe. Tudo isso pode ser o trailer do que pode acontecer com alguns candidatos no ano de 2022", pontuou.

A disputa pelo governo do Ceará no ano que vem promete. O bolsonarista Capitão Wagner, deputado da base de apoio do presidente no Congresso, tenta se cacifar para interromper a série de governos ligados aos Gomes e ao PT no estado. 

Além do presidente da República, conta com o apoio do coronel Aginaldo de Oliveira, à frente da Força Nacional nacional e marido da também deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP), uma das mais próximas aliadas da família Bolsonaro.

Clique aqui para ler a decisão / 0816429-45.2021.4.05.8100T

Rafa Santos é repórter da revista Consultor Jurídico.


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