'Facada nas costas', 'raiva' e 'amargura': entenda por que a França reagiu com termos duros a um acordo entre EUA e Austrália

A França tinha um contrato bilionário para fornecer 12 submarinos para a Austrália. Os EUA resolveram que iriam fornecer submarino com tecnologia nuclear para os australianos, que cancelaram o negócio com Paris.

A França está oficialmente descontente e aborrecida com dois países historicamente considerados parceiros: os Estados Unidos e a Austrália.

O anúncio de um pacto de segurança unindo EUA, Reino Unido e Austrália provoca reação indignada da China, confira vídeo aqui.

Para deixar isso claro, o ministro das Relações Exteriores da França, Jean-Yves Le Drian, fez declarações fora do comum nesta quinta-feira (16), dizendo que o governo de Joe Biden, dos Estados Unidos, foi imprudente como o de seu antecessor, Donald Trump, e que seu país tomou uma facada nas costas por causa de um acordo fechado entre australianos e americanos.

A França foi além e cancelou um evento de gala que estava marcado para acontecer na embaixada dos Estados Unidos em Paris, em comemoração aos 240 anos de uma das batalhas da Guerra de Independência dos EUA, no século 18 (historicamente, os franceses foram os primeiros aliados dos americanos em sua luta para se libertar do Império Britânico).

As manifestações incisivas de descontentamento aconteceram por um motivo: os EUA fecharam um negócio com a Austrália para o desenvolvimento de um submarino movido por energia atômica, no contexto da criação de uma nova aliança internacional, que inclui também o Reino Unido, chamada Aukus.

O problema é que a França tinha um acordo para fornecer submarinos convencionais para a Austrália, e esperava receber bilhões de dólares com essa venda. E esse acordo foi abandonado pelos australianos, que deram preferência aos americanos.

Essa decisão brutal, unilateral e imprevisível me lembra muito o que o Sr. Trump costumava fazer, afirmou o chanceler francês, Jean-Yves Le Drian, à rádio France Info. Estou com raiva e amargo. Isso não é feito entre aliados. É uma facada nas costas. Criamos uma relação de confiança com a Austrália e essa confiança foi quebrada, disse também Le Drian.

Como foi o anúncio do acordo entre EUA e Austrália?

Foi na quarta-feira que o presidente Joe Biden anunciou que fechou um negócio com a Austrália para o desenvolvimento de submarinos movidos por energia atômica.

Ao anunciar o acordo, na quarta-feira, Biden disse que a ideia era reforçar as alianças do país e, também, atualizar as prioridades estratégicas dos EUA. A Austrália fica perto da China, e ter uma parceria militar com os australianos é do interesse dos americanos.

Como era o negócio entre França e Austrália?

Os franceses estavam negociando a venda de submarinos da empresa estatal DCNS, com tecnologia deles (sem o reator nuclear) para a Austrália, e esperavam uma receita de até US$ 66 bilhões com esse contrato.

Os dois países iriam construir 12 submarinos convencionais, movidos a diesel e eletricidade. As embarcações estariam entre as maiores do mundo.

Esse contrato foi cancelado, anunciou a Austrália.

A Austrália já tinha desembolsado US$ 1,8 bilhão no projeto desde 2016. A expectativa era que em 2027 fosse entregue o primeiro submarino com tecnologia da DCNS.

Por que a Austrália não fechou o negócio com os EUA antes?

Esses submarinos são muito mais difíceis de serem detectados do que os tradicionais. Os submarinos nucleares podem ficar submersos durante meses, diferentemente dos tradicionais, que podem ficar debaixo d'água por no máximo algumas semanas.

Os propulsores do submarino têm reatores nucleares, mas, por acordo internacional, a Austrália não pode ter armas nucleares.

O primeiro-ministro do país, Scott Morrison, afirmou que em 2016, quando a Austrália começou a pesquisa para comprar submarinos, esse tipo de embarcação não estava disponível para venda (até o anúncio do acordo, os EUA só haviam compartilhado sua tecnologia com o Reino Unido).

Como a França reagiu?

O negócio dos americanos com os australianos foi uma decisão "unilateral, brutal e imprevisível", disse o ministro de Relações Estrangeiras da França, Jean-Yves Le Drian.

Foi nesse contexto que Le Drian disse que o contrato dos EUA lembram as decisões irascíveis dos anos de Donald Trump e se trata de uma facada nas costas.

"Isso é algo que não se faz entre aliados", disse Le Drian. Ele afirmou que a França não foi consultada sobre a parceria entre os americanos e os australianos. Segundo o jornal "The New York Times", o governo Biden não avisou os franceses porque tinha percebido que isso iria deixá-los insatisfeitos. Os australianos que deveriam ter avisado os franceses, de acordo com a gestão de Biden.

Le Drian e a ministra das Forças Armadas da França, Florence Parly, disseram que a decisão dos americanos é lamentável e mostra falta de coerência.

A França também ficou irritada ao saber que o Reino Unido também participou do negócio —os britânicos têm falado de uma estratégia do "Reino Unido Global", e os franceses suspeitam que isso implica a formação de uma aliança informal de países anglófonos.

O que a Austrália disse?

Morrison, o primeiro-ministro da Austrália, nem mesmo mencionou os franceses durante o encontro com Biden e Boris Johnson para anunciar a nova parceria.


Ele só se pronunciou depois, e repetiu diversas vezes que se trata de uma decisão estratégica para o país. "Claro que eles (os franceses) estão frustrados. Eles foram bons parceiros. Isso (o contrato de submarinos) é um tema de nosso interesse estratégico, nossas necessidades de capacidade estratégica, e um ambiente estratégico modificado, e nós tivemos que tomar essa decisão", disse.

E a China?

Os franceses não foram os únicos que reagiram ao negócio dos EUA com a Austrália. A China também recebeu mal a notícia.

Washington e seus aliados estão procurando maneiras de repelir o poder e a influência crescentes da China, particularmente seu desenvolvimento militar, sua pressão sobre Taiwan e suas incursões no disputado Mar do Sul da China.

Os três líderes ocidentais, ao formalizarem o Aukus, não mencionaram a China, e autoridades de alto escalão do governo Biden que informaram os repórteres previamente disseram que a parceria não visa se contrapor a Pequim.

Mas o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores chinês, Zhao Lijian, disse que os três países estão "danificando seriamente a paz e a estabilidade regionais, intensificando uma corrida armamentista e danificando os esforços internacionais de não-proliferação nuclear".

Países não deveriam formar parcerias que visam terceiros países, disse ele.

A França e a União Europeia não querem entrar em um confronto direto com a China. A estratégia dos europeus é cooperar com os chineses em alguns pontos, e criticar algumas das políticas dos asiáticos –por exemplo, em relação aos direitos humanos. G1

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