Preferência de deputados pelo ‘distritão’ é ‘lei da sobrevivência’

Da BBC:
Uma comissão especial da Câmara dos Deputados deve votar, nesta terça-feira, o relatório da reforma política, que tem entre seus temas principais a mudança na forma como elegemos deputados federais e estaduais.

O relatório final propõe o sistema majoritário, em vez do atual sistema proporcional. Se aprovado pela comissão, o relatório irá a votação em plenário.

Hoje, para serem eleitos, os candidatos dependem não apenas dos votos que recebem, mas também dos votos recebidos pelo partido ou coligação.

No sistema proposto pela reforma, entrariam os deputados que recebessem o maior número de votos em determinado Estado – é o chamado “distritão”.

A mudança, defendida pelo PMDB, tem sido criticada por muitos cientistas políticos, que afirmam que a proposta pode fragilizar ainda mais os partidos, aumentar a personalização das campanhas e provocar o desperdício de votos (só seriam “úteis” os votos nos candidatos eleitos. Atualmente, como os votos são dados aos partidos e aos candidatos, só se ‘perdem’ os votos em candidatos cujos partidos não elegeram ninguém).

A polêmica é tanta que até mesmo o relator da comissão especial da reforma política, deputado Marcelo Castro (PMDB-PI), tornou-se crítico ao próprio relatório.

Ele diz que a maioria dos especialistas ouvidos pela comissão advertiu contra a adoção do “distritão” e foi mais favorável ao modelo distrital misto. Neste, metade da Casa é eleita pelo voto distrital – em que vence o candidato mais votado em cada região – e a outra metade é escolhida proporcionalmente pelo voto no partido.

Mas Castro afirma que os deputados acabaram simpatizando com o “distritão” por instinto de sobrevivência: tentar assegurar sua reeleição.

Leia a entrevista que o deputado concedeu à BBC Brasil por telefone, na última sexta-feira:

BBC Brasil – O senhor pretende votar contra seu próprio relatório?

Marcelo Castro – Veja, passamos praticamente três meses debatendo a reforma política, recebemos presidentes dos partidos, e praticamente todos os cientistas políticos mais renomados estiveram na nossa comissão. Minha ideia era formar uma massa crítica para que decidíssemos com segurança.

Sempre fui partidário do sistema distrital misto de inspiração alemã. (…) A ONU recentemente fez uma pesquisa com cientistas políticos, perguntando qual o melhor sistema, e a ampla maioria respondeu que era o misto.

Na comissão, todos os cientistas ouvidos defenderam o distrital misto, menos um, que achou mais prudente manter o atual sistema proporcional mas com modificações.

O único (defensor) do “distritão” foi (o vice-presidente) Michel Temer. Os demais disseram que ele vai piorar nossos defeitos, encarecer nossas campanhas.

Mas eu fiz um compromisso com a comissão (especial da reforma) de não ser relator de mim próprio – o que tiver apoio da maioria vai ao meu relatório. E (a maioria dos integrantes da comissão) preferiu o “distritão”.

Fui obrigado a relatar. Vou votar a favor porque tem inúmeros temas (abordados no relatório além do sistema de voto), mas no plenário vou votar contra o “distritão”, e nos destaques também. Prefiro que fique como está, apesar de termos talvez o pior sistema de voto do mundo.

Hoje, um eleitor de São Paulo tem de escolher entre 3 mil candidatos (a deputado). É irracional. Não tem como fazer uma opção segura. Tem que acabar com isso. E a fragmentação partidária é muito grave. Precisamos de uma reforma que fortaleça os partidos, tornando-os mais fortes, coesos, com disciplina interna e conteúdo ideológico e programático, para o eleitor ter clareza pelo que é a favor e contra o que está votando. O “distritão” vai enfraquecer isso mais ainda.

(…)

Post a Comment

Aviso aos internautas:
Quando você comenta como anônimo, sua opinião não tem nenhum valor e não será publicada. Portanto pedimos aos nossos leitores que ao fazer comentários se identifiquem.
A sua opinião é muito importante para nós.

Postagem Anterior Próxima Postagem