Operação da PF contra Ciro Gomes indica que Bolsonaro jogará sujo nas eleições

Desidratado nas pesquisas de intenção de voto, Jair Bolsonaro dá os primeiros sinais de que pretende fraudar mesmo o jogo eleitoral — e, com certeza, atuará de forma ainda mais pesada daqui para frente. Como todo caudilho, ele aparelhou as instituições públicas, criando um Estado Policial que já passou a atuar a seu favor sob a falsa capa da legalidade. Assim se explica a extemporânea ação da PF contra Ciro e Cid Gomes

QUESTÃO DE ORDEM 👆: Os irmãos Ciro e Cid Gomes (no banco traseiro): se houve corrupção nas obras do Castelão, eles têm de ser punidos: pelas leis dos códigos, não pelas leis de exceção de Bolsonaro (Crédito: Gustavo Miranda)

Antonio Carlos Prado e Ricardo Chapola

Governantes totalitários aparelham instituições do Estado com o claro objetivo de usá-las de forma patrimonialista, sobretudo em situações fraudadas – até porque, se fosse para acioná-las nos momentos em que de fato se fizessem necessários, elas não precisariam ser aparelhadas. Ou seja: aparelham-nas tendo em mente eventuais armações políticas. Essa é a lógica do caudilhismo, e é a metodologia populista seguida à risca por Jair Bolsonaro. Junte-se à ela o seu desespero por estar anêmico e despencando nas pesquisas de intenção de voto para as eleições presidenciais de 2022, e tem-se a trilha da surpreendente, extemporânea e anacrônica operação de busca e apreensão da Polícia Federal (com ordem da Justiça) contra Ciro Gomes, pré-candidato do PDT à Presidência da República, e seus irmãos Cid Gomes, senador, e Lucio Gomes, engenheiro (foram cumpridos outros onze mandados). Feita uma análise mais aguçada, poucas dúvidas restam de que a manobra de Bolsonaro, que domina a PF, é somente uma pequena amostra daquilo a que ele está disposto a fazer para tumultuar o processo eleitoral. A ação da PF deu-se de tal forma fora do tempo, que denunciou a si própria e dela exalou o cheiro de armação por parte do Planalto. Bolsonaro já declarou que aceita apenas um resultado advindo das urnas: a sua vitória. Na semana passada plantou um plano. Outros, mais perigosos, virão.

O objetivo da PF, oficialmente declarado, foi dar sequência às investigações sobre suposta corrupção nas obras do estádio de futebol Castelão, em Fortaleza, envolvendo a empresa Galvão Engenharia, em 2012 (seria algo em torno de R$ 11 milhões em propinas). O inquérito teve início em 2017. E agora, somente agora, na quarta-feira 15 de dezembro de 2021, a PF resolveu sair à rua para trabalhar? Claro que é preciso apurar se houve crime e responsabilizar culpados, se houver, mas depois de quatro anos de imobilidade a primeira providência legal não é pedir mandado de busca e apreensão. Esse streptus judicii, antes mesmo de abertura de processo, reforça a possível encenação. “É completamente aberrante e calunioso”, disse Ciro Gomes.

Mais: “guardo absoluta certeza de que a operação da Polícia Federal teve a influência do presidente Jair Bolsonaro”. Tudo leva a crer que Bolsonaro de fato manipulou a PF, uma vez que já promoveu vinte alterações em cargos relevantes na corporação, para dominá-la e blindar a si, sua família e amigos. Isso é bem mais grave do que se pode imaginar à primeira vista. O ato do presidente caracteriza a existência de um Estado Policial que funciona sob a falsa aparência da legalidade. Se traduzido em modelo de regime político, tal Estado chama-se fascismo, e sua expressão máxima no Brasil foi o falso “Documento Cohen”, com o qual Getúlio Vargas legitimou a ditadura do Estado Novo em novembro de 1937.

As armações se sustentam em mentiras, e não vai aqui nenhuma novidade se lembrarmos das toneladas de inverdades das quais o capitão se valeu na campanha de 2018 e, também, do fato de ele almoçar e jantar fake news. O ano nem virou e já joga pesado como o fez na semana passada. Dá para imaginar como jogará nos meses que antecederem as eleições. “O presidente Bolsonaro, que é um moleque maior, está aparelhando a PF. Ele recrutou um medíocre, aliado de seus familiares, para dirigir a instituição (referência a Paulo Maiurino)”, disse Cid Gomes, que governava o Ceará à época da reforma do Castelão. “Eu pensava que estava vivendo em uma democracia com graves imperfeições, mas Bolsonaro nomeou como diretor-geral da PF um cidadão que jamais foi superintendente em nenhum lugar do Brasil, por mera cumplicidade e acompadro com os seus filhos”, afirmou Ciro. No PDT, partido integrado pela família, os irmãos receberam apoio de correligionários na tribuna parlamentar, mas, nos bastidores, muitos aproveitaram a situação para forçar Ciro – que vive um clima de hostilidade com a bancada federal de deputados — a retirar sua pré-candidatura à Presidência da República. Principal motivo: ele segue engatinhando com 5% (pesquisa do Ipec) nas enquetes de intenção de votos.



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